quarta-feira, 30 de maio de 2007

Acontece
Por Ana Luisa Lima.


Toda vez que falava em mudança, nunca era mudança de verdade. As minhas lembranças, eu apenas colocava dentro de novas caixas e as mudava de lugar. Cada vez mais escondidas, empoeiradas. Cada vez mais. O plano era um dia jogá-las fora.

Mas, sempre arrumava um tempo para revisitá-las; colocar mais uma ou duas fotos antes que tivesse vontade de rasgá-las. Junto à poeira: mais uma ou duas fotos, desenhos, discos, livros e cartas.

Juntos. Tudo o que nos diz respeito está guardado junto com minha alma – em algum lugar. Talvez, à espera do lugar, dia e hora exatos. Dia marcado num calendário impreciso. O tempo contado por ponteiros desajustados. Lugar perdido num mapa imaginário.

Enquanto a espera por você não finda, nada em mim acontece.

Acontece que já não sei mais amar.

quinta-feira, 24 de maio de 2007

Cinzas
a Ju Rocha.
Por Ana Luisa Lima.



Ela passou longo tempo sentada no cantinho do terraço que dá para o quintal à espera do quem-sabe-o-quê-?. O relógio fazia o seu trabalho. Marcava o tempo. Mas ela, anacronicamente, em outro mundo, viu seus olhos pesarem. Já sabia, seu olhar se tinha tornado um pouco mais negro.

O semblante caído era o de menos. Tudo que queria era fazer a dor parar. Uma falta de ar. Uma exasperação sem fim. Sem motivo: por aquele motivo de sempre: a falta (dele?).

Seus esforços eram para lembrar os dias de carnaval. Os dias em que a alegria, ainda que fosse uma mera alegoria, preenchia. Queria fazer aquela sensação voltar. O beijo anônimo. O braço dado com o desconhecido. Era o amor inventado – forjado. Mas era. Fantasia, com todos os brilhos e adereços, tornada realidade - pelo menos naqueles quatro dias.

O copo secou. Não pode se iludir: - Está meio cheio. Tudo é vazio: o copo, a alma. Tomou o vinho, ficou o torpor.

Viu a lua deitar e sol acender...

Um mal para uma criatura pálida. Ávida por sangue (vida), sedenta e impura. Sentir. Qualquer coisa ainda que. A angústia até o fim...

segunda-feira, 14 de maio de 2007

[H]á Espaços.
Por Júlia Rocha



Na pele senti. Amor. E me entreguei assim:



Na pele me dei. Dor. E me enganei assim:




Não sei em que parte de nós. Veio esse medo. E essa certeza:




Não sei, amor, que medo é esse de. Te ter em mim. Te ver aqui. Estar tão longe.

Descobri que tenho medo da felicidade. E me dou assim:







E me entrego assim:













[H]á espaços do que sou em mim .......................... pele - sentimentos - e um mundo difuso de nós.

sexta-feira, 11 de maio de 2007

Lucid dreams
Por Ana Luisa Lima.


Nunca pretendi vencê-lo, então, dei-me logo por vencida. Não pude apagá-lo de mim, ainda mais agora que foi tatuado do lado esquerdo. Era o único jeito... Era preciso tê-lo. Por perto. Como um satélite. Acerca. Envolto. Como o cheiro bom de todas nossas manhãs.

Voltamos às gentilezas, às cartas trocadas – com direito a desenhos coloridos nos cantos da página. Voltamos às ligações intransitivas e desesperadas – nos ligamos por motivos banais - e eu já acabei minha cota de desculpas esfarrapadas.

Voltamos aos chocolates. Ele já não me reconhece em minha magreza. Estimula o retorno de cada grama. Desde que foi embora, minhas roupas diminuíram duas medidas. Reclama que já não há tantas carnes. A saliência dos meus ossos o deprime. Ele transformou-me em outra mulher: não mais bela, sublime.

Na medida certa, voltamos aos sorrisos.

Tudo como antes: delicadamente inquieto: deliciosamente impreciso.

sexta-feira, 4 de maio de 2007


Por Ana Luisa Lima.
No Meio De.
Por Júlia Rocha


Por entre
A pele
E o desejo
O latente
De te querer
Aqui.

Por entre
Eu
E mim
A permanência
De ti.

O querer
Aqui
Permanente:
Desejar
A mim
Por entre
A pele
Que eu
Latejo
Em ti.

quinta-feira, 3 de maio de 2007

playing around
Por Ana Luisa Lima.


Devolvo tuas palavras com a saliva de minha boca. Vem. Bebe. Sei da sede.

Mas te deténs. Disfarças teu desejo debaixo da pele, te escondes detrás desse alguém - que não conheço. Simulas uma outra vida e me dizes cinicamente que não és meu. Sei de ti.

Gosto do teu Eu que vem à tona no quando de estarmos sós. O teu silêncio vira grito.
O meu olvido.
Teu desespero.
É quando descobres que eu minto.

Não amo. Não sinto(,) amor. Sou refém do meu próprio deserto. Não sou sua, nem minha, tampouco de outro alguém (sou de muitos, se queres saber ao certo).

A casca dura. Foi a cura. E no entanto.

Para ti, ouso amolecer (de quando em quando):
sobre teu corpo.
Devolve minhas palavras - na tua boca.

Nosso amor sempre foi essa brincadeira de mau gosto: gramaticalmente tu finges não me querer, enquanto matematicamente finjo ressurgir o que já é morto.

quarta-feira, 2 de maio de 2007

Sentidos
Por Júlia Rocha

A palavra ouvida sem a fala,
O silêncio quebrado pelo olhar,
Um desejo maciço que não cala
Ao sentir o teu cheiro aproximar.

Um calar que se grita em todo canto,
Tateando o teu corpo pelo ar,
Vou sentindo na pele teu encanto,
Pelo abraço aprendendo a te beijar.

O teu corpo, menina, tem sabor
De um doce gostoso ao paladar,
O teu cheiro, um aroma sedutor,
Meu gostar se entregando pelo olhar.

Sou menina, criança, vou brincando,
Descobrindo o meu jeito de mulher,
Nesse jogo de tato vou mostrando
Minha pele dizendo que te quer.